Sardão
Lacerta lepida
Créditos: 
Ignacio García

O Sardão é o maior lagarto da península Ibérica, apresentando uma distribuição generalizada por toda a península (com exceção da cordilheira Cantábrica),  Sudeste de França e Noroeste de Itália. Pode ser encontrado numa grande variedade de habitats, desde o nível do mar até regiões montanhosas como a Serra da Estrela e os Pirenéus. Prefere áreas com boa exposição solar, principalmente junto de abrigos como muros, amontoados de pedras ou locais com matos densos nas imediações. Pode também ser encontrado nas periferias das cidades ou em campos de cultivo, principalmente se ladeados por muros de pedra. Evita zonas excessivamente húmidas e sombrias. Pode escavar as suas próprias tocas ou utilizar buracos já escavados por outros animais (como os coelhos por exemplo) ou então utilizar fendas em pedras, muros ou troncos de árvores como abrigo.

Durante o inverno cessa a sua atividade, hibernando durante períodos variáveis consoante as condições climáticas. A época de reprodução inicia-se em meados de março, quando os dias começam a ficar mais quentes e soalheiros, e estende-se até meados de Julho, altura em que as fêmeas escavam um buraco para colocarem os ovos. Os juvenis nascem cerca de 3 meses depois. É comum ver este lagarto a tomar banhos de sol, embora durante o verão evite as horas de maior calor.

Estudos genéticos indicam que, apesar de não ser uma subespécie, os sardões das Berlengas constituem uma população localmente diferenciada, que terá colonizado a ilha há 9000 a 10 000 anos. Esta população apresenta uma série de características morfológicas e comportamentais de adaptação às condições insulares, que a distingue das populações continentais. Devido a ter evoluído praticamente sem predadores naturais nos últimos milhares de anos, os lagartos da Berlenga apresentam relaxamento dos mecanismos anti-predatórios: correm muito pior que os lagartos do continente, permitem maiores aproximações e são menos agressivos perante potenciais predadores. Por outro lado, enquanto no continente os machos são territoriais e bastante agressivos a defender os seus territórios de outros machos, na Berlenga, devido à escassez de habitat disponível, os sardões vivem em aglomerados populacionais. Na ilha, os encontros entre indivíduos são mais frequentes pelo que comportamentos muito territoriais implicariam um excessivo gasto de energia a defender os territórios. Assim, pensa-se que ao longo dos milhares de anos em que os sardões povoaram a ilha, os indivíduos menos agressivos foram sendo selecionados. Como resultado da seleção natural, estes lagartos são menos territoriais que os lagartos do continente, são mais tolerantes uns com os outros, lutam menos entre si e, quando o fazem, são muito menos agressivos.

Desde 1985 que a população de sardão foi objeto de estudos demográficos, no âmbito dos quais se realizaram entre 1991 e 2004 censos anuais detalhados para acompanhar a sua evolução. Entre 1994 e 2001, decorreu um protocolo de colaboração entre a Reserva Natural das Berlengas e o Centro de Biologia Ambiental da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa que enquadrou o projeto "monitorização e  controle da população de lagartos da ilha da Berlenga". Durante este projeto verificou-se que a população de sardão apresentava de ano para ano um acentuado declínio no número de indivíduos, aproximando-se perigosamente da extinção. A população de cerca de 100 lagartos, que em 1991 ocupava grande parte da ilha da Berlenga e o ilhéu O-da-Velha, estava em 1998 reduzida a 9 indivíduos na zona do farol e apenas um indivíduo no ilhéu O-da-Velha. Em 2001 só foram detetados  6 lagartos na zona do farol, o que traduz a situação preocupante em que esta população se encontra. 

O brutal aumento da população de gaivotas-de-patas-amarelas é, provavelmente, um dos principais fatores que contribuiu para a drástica redução de sardões nas Berlengas. As gaivotas ocupam muito espaço, o que diminui claramente a área possível para a população de lagartos. Muitos ninhos foram construídos exatamente nas áreas das tocas antes ocupadas por lagartos. O impacto das gaivotas sobre os lagartos não é de predação, mas sim de ataque para defesa dos ninhos (que aumenta quando os ninhos estão na proximidade das tocas dos lagartos), o que, numa população de efetivo tão reduzido, torna-se muito significativa. Durante o período de incubação, os ratos-pretos podem ter um papel importante devido à predação das posturas, que são enterradas no solo e deixadas sem cuidados parentais. Também os coelhos podem contribuir para a destruição de posturas de sardões devido à sua intensa atividade de escavar novos túneis.

Em 1999 foi implementado um plano de recuperação que visava aumentar o número de indivíduos na ilha, de modo a assegurar a viabilidade da população, por meio de reprodução de sardões em cativeiro e sua posterior libertação na ilha. Entre 1999 e 2000 foram libertados 21 sardões num cercado livre de predadores, no entanto, aparentemente estes esforços foram infrutíferos. O último registo de sardão que se conhece nas Berlengas data de 2010 e não é de excluir que a espécie esteja extinta nas Berlengas.