Estelas e Berlenga
Créditos: 
Elisabete Duarte

A ilha da Berlenga constitui um planalto de granito rosa com formas arredondadas, marcado por uma linha de costa muito recortada, onde sobressaem diversas enseadas, grutas, arcos, carreiros, pequenos ilhéus e rochedos. Todas estas formas de relevo são, na sua maioria, consequência de processos geológicos. Destaca-se os carreiros muito encaixados e relativamente alinhados, como por exemplo os dos Cações e do Mosteiro, que quase separam a ilha da Berlenga em dois fragmentos, a ilha Velha e a Berlenga, e lhe conferem a curiosa forma de oito. De facto, o desenvolvimento dos dois carreiros anteriores está condicionado pelo traçado de uma falha inversa atualmente inativa; a sua muito antiga movimentação produziu esmagamento e fragmentação do maciço granítico, que devido ao efeito posterior dos agentes erosivos durante milhares ou milhões de anos permitiu que ocorresse maior desagregação dos materiais rochosos ao longo do traçado da falha.

Em torno de toda a ilha da Berlenga há outros exemplos de geoformas singulares, algumas das quais bastante cénicas, que também estão associadas ao traçado de antigas falhas hoje inativas, como por exemplo, o Carreiro da Inês, o Furado Grande e Pequeno. O estádio da evolução erosiva ao longo do traçado destas falhas é bem distinto; enquanto na falha da Inês a erosão da sua caixa é já muito avançada, sendo responsável pela separação entre a ilha da Berlenga e o ilhéu da Inês, na falha do Furado o processo erosivo está no início, pois a erosão é acentuada ao nível das águas do mar pela ação abrasiva das suas ondas, porém na parte superior do traçado da falha ainda se observam pontes e arcos naturais.

Outras geoformas interessantes consistem em cavidades, grutas, arcos e pontes naturais que se desenvolveram nas arribas da ilha da Berlenga, como por exemplo a Cova do Sono, a Cabeça do Elefante, a Gruta Azul, a Gruta de S. João Baptista e o Furado. Estas formas de relevo foram originadas, essencialmente, por ação mecânica das ondas do mar sobre a base das arribas, onde as rochas graníticas foram desgastadas mais intensamente; porém, a sua maior ou menor desagregação está condicionada por fatores de natureza geológica que caraterizam as rochas graníticas.

A câmara magmática onde se geraram os magmas que deram origem ao granito das Berlengas instalou-se por fusão de materiais no interior de uma crusta composta por rochas encaixantes possivelmente similares às que afloram nos Farilhões e Forcadas. Nesta câmara magmática ocorreu o arrefecimento do magma com formação de minerais, primeiro os mais pesados de natureza ferromagnesiana e, posteriormente, os menos densos, feldspatos e quartzo. Se a presença de água na câmara magmática for significativa, pode ocorrer alteração dos minerais ferromagnesianos (micas) por libertação de iões de ferro, que eventualmente poderão ser captados pela superfície rugosa dos feldspatos, tornando-os rosados, daí a cor do granito das Berlengas. Porém, o mesmo processo de alteração pode suceder posteriormente, após solidificação dos minerais que compõem o granito na presença de água abundante por meteorização química. Porém, uma das situações não exclui a outra.

No bloco levantado e erosionado que constitui o soco antigo das Berlengas não se identificaram sinais ou evidências da sua evolução durante os tempos mesozoicos. Porém, foram descobertos numerosos fragmentos de granito rosa e de rochas metamórficas similares às identificadas no arquipélago em estratos de diversas unidades do jurássico que afloram no Cabo Carvoeiro, Baleal, etc., bem como no tufo-brecha da Papoa, sugerindo que a dimensão do bloco de terreno que contém o arquipélago teria sido muito maior que o atual.

Mais recentemente, foram reconhecidos traços da sua evolução nos últimos milhões de anos, porém as referências temporais para a sucessão contínua de eventos são muito difíceis de hierarquizar. A sua forma arredondada e a superfície relativamente aplanada do seu topo sugerem que estamos na presença de uma antiga plataforma de abrasão marinha; esta hipótese é confirmada pela identificação de formas erosivas, na qual se destacam as marmitas, que se desenvolveram no topo da superfície de aplanação quando esta se encontrava no fundo do mar. Por outro lado, a ausência de estruturas morfológicas típicas da erosão de maciços graníticos e de solos na superfície da ilha das Berlengas sugerem que esteve durante longos períodos de tempo debaixo de água. Porém, não se sabe quando tal ocorreu.

Por outro lado, a existência de pequenas cavidades e grutas nas arribas acima do nível médio atual das águas do mar, como por exemplo o Furado Seco, e de terraços marinhos que correspondem a depósitos residuais de antigas praias, localizados a altitudes similares, parecem indicar que o nível do mar já esteve posicionado naquele horizonte. Estas observações sugerem variações do nível médio das águas do mar, eventualmente consequência de glaciações, pois as taxas de subida ou descida dos blocos tectónicos são muito reduzidas na região.

A observação detalhada da superfície das Berlengas evidencia a presença de uma rede de drenagem, pouco desenvolvida e não muito pronunciada. De facto, as linhas de água identificadas, junto ao farol, estão sobrelevadas algumas dezenas de metros acima do nível do mar. Assim, quando ocorre precipitação as águas das chuvas são levadas e caem diretamente no mar em cascatas. Esta situação evidência que a taxa de erosão do maciço granítico é menor do que a velocidade das variações do nível médio das águas do mar.